Reflexões sobre investigação em Matemática
Quem ler trabalhos de investigação em qualquer das mais variadas áreas da Matemática (dita) pura, deparará, de um modo mais ou menos vincado, com um texto sintético. Como não se trata de um livro de texto, as revistas limitam naturalmente o número de páginas para que um artigo seja aceite.
Terá o autor, deste modo, de seleccionar o que é pressupostamente conhecido, quer em termos de definições quer no que diz respeito aos resultados. Poderá contudo referenciá-los, remetendo o leitor menos familiarizado para outros artigos.
Por outro lado, também as demonstrações dos novos resultados não podem aparecer no artigo com todo o detalhe. Frases como "é fácil provar que...", "é trivial que...", "podemos, sem perda de generalidade, considerar...", são duplamente enganadoras. Por um lado, tudo dependendo da experiência do leitor, o fácil não o é para todos. Por outra parte, aquelas expressões escondem o verdadeiro trabalho que o autor teve para chegar ao que de seguida afirma. Pode até acontecer que tenha levado dias (ou semanas...) para atingir aquilo que afirma ser fácil. Sucede que, finalizada a tarefa, o autor pode achar que tudo aquilo que fez (cálculos ou raciocínios) não precisa de ser dito no artigo, mas merece tão só uma pequena frase.
Este poder de síntese é, afinal, uma característica da própria Matemática. Como lembrava o Prof. J.F. Queiró numa entrevista publicada há tempos no Boletim das SPM, pense-se no que a curta frase "A derivada do seno é o coseno" abrevia.
Escrever artigos de matemática pode pois revelar-se um esforço "holmesiano" de enunciar conclusões, "elementares" ou não, sem apresentar a totalidade da cadeia de raciocínios subjacentes aos resultados.
A tarefa do leitor/estudante será a de preencher um puzzle do qual possui apenas algumas peças, estando as outras dispersas em "caixas" distintas. Quando as tiver finalmente, pode deparar com uma secretária um pouco desarrumada...
Manuel Mota
APM Coimbra
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